martes, 15 de noviembre de 2011

Máscaras

Viviam em um lugar muito parecido a qualquer outro lugar no mundo. Eram crianças, e como todas as crianças, encontravam sempre motivos para serem felizes. Neste lugar, quando se completava doze anos, assim como um rito de passagem, as crianças ganhavam uma máscara a qual teriam que usá-las para o resto da vida. Não se via, neste lugar, nenhum adulto sem máscaras. Assim, desde que se nascia até completar doze anos, as crianças eram preparadas para encontrar sua máscara ideal. O normal era ser feliz com esta sina. Mas, ao contrário dele e da maioria, ela não era feliz com a sina que a esperava. Não entendia que felicidade poderia ter em esconder-se detrás de uma máscara, às vezes, queria ficar criança para sempre. Porém, não podia fugir de sua sina. E quando completou doze anos, assim como todas as crianças, teve que colocar sua máscara. Máscara esta, escolhida por sua mãe.
Ao colocá-la, sentiu seu rosto queimar e uma dor profunda tomou conta de sua alma. Desde esse dia ela era só dor. Cresceu, tecendo esse fio da vida. E neste emaranhado, sabia-se ligada a ele por seu enorme amor e sabia também do medo que tinha de perdê-lo atrás da máscara. O tempo foi passando em seu corpo e ela se transformando em mulher, uma mulher sem rosto, mas uma mulher.
Numa noite de lua, sozinha em seu quarto ela observa seu corpo nu diante do espelho e, num gesto de  sobrevivência, arranca a máscara de seu rosto. Com as mãos trêmulas toca pela primeira vez seu rosto de mulher. Que linda que era. Que imenso que era se ver, simplesmente se ver. Sua alma se despe agora de toda a dor e caminha livre. Em meio ao êxtase do se conhecer, ela adormece abraçada a máscara que não é mais sua.
Desperta com a luz do sol em seu rosto, corre para o espelho e mais uma vez se olha, se toca e ver que não tinha sonhado. Sim, é ela sim. Ela é esta mulher que a máscara escondia. Escuta a voz de sua mãe. Sabia que chegara o momento. O momento indiscutivelmente seu. O momento de Ser. E assim, completamente despida, desse as escadas, olha profundo nos olhos de sua mãe e devolve a ela a máscara que nunca lhe serviu. Sem olhar para trás sai pelas ruas, caminha por entre as pessoas. Vê o medo estampado em seu olhos. Algumas, assustadas, correm dela,  outras tentam em vão cobri-la, existem também,  as que  criam coragem e tiram suas máscaras. Ela simplesmente caminha. Pára diante dele. E, num gesto de compaixão toca-lhe a máscara e tenta arrancá-la. Ele sangra. A dor lhe é insuportável e ele foge. Só então, ela percebe que para ele a dor de Ser é bem maior que a de não Ser. Comovida, chora a dor do outro.



domingo, 13 de noviembre de 2011

A procura

Estava diante do espelho. Olhava profundamente dentro de seu olhar. Buscava-o. Não o encontrou. Ele não mais estava no reflexo dos seus olhos. Onde estaria? O teria perdido? Não sabia. Sua alma, num gesto de desespero, saiu a procurá-lo. Caminhou pelo tempo, os seus tempos, mas não o viu. Ele estava em outro tempo que não o seu, em outra mirada que não a sua... Sim, ele estava. Estava  no brilho do olhar de outra mulher. Ali o encontrou.
Estupefata, sua alma, não encontrou caminhos para voltar e anda perdida pela vida. Seus olhos, sem ter mais o que refletir, partiram-se em pedaços...

viernes, 11 de noviembre de 2011

Sobre a beleza de ler(te)

Ontem tive um sonho. Sonhei que saías de um livro e te transformavas em  sons que inundavam todo o meu Ser. Foi lindo ler-Te.

sábado, 5 de noviembre de 2011

Quereres


Queria ser uma melodia que percorresse o espaço e chegasse até você, sussurrasse em seu ouvido todo o meu querer e lhe inundasse com meus sons... Queria poder chegar até você...

miércoles, 2 de noviembre de 2011

Silêncio

Hoje sou só silêncio. As palavras teimam em não se fazerem vida. Estão lá guardadas no mais profundo de minh'alma, esperando talvez, o momento de se dizerem. Talvez não, talvez não exista esse momento e elas, as palavras, ficarão presas na imensidão do não Ser. Serão então silêncio, o mais puro silêncio.

martes, 1 de noviembre de 2011

Sobre o olhar

Desde muito pequena aprendeu que para ver melhor, é preciso fechar os olhos. Quando o seu pai partiu, sempre que o queria ver, fechava seus olhos. Assim, com os olhos fechados, o via caminhando pela casa, brincando com ela, cozinhando para ela. Sendo com ela.
Naquela tarde nublada, caminhando só, por aquela cidade que não era sua, sentia uma necessidade quase vital de lembrar aquele homem que, como seu pai, esteve sempre presente em seus sonhos e completamente ausente em sua vida. Talvez essa necessidade lhe era tão urgente, por estar novamente em outro país, por sentir-se completamente estrangeira de si mesma. Precisava sentir alguém próximo a ela, nem que fosse por alguns minutos. Precisava.
Caminhou até o parque mais próximo, sentou-se diante do lago e fechou os olhos para olhar. Ele estava sentado do outro lado do lago, parecia ler um livro. Não. Ele escrevia poesia. A cada poesia que escrevia, fazia um aviãozinho com o papel e jogava em sua direção. Algumas lhe chegaram, outras caíram no lago e havia as que com a força do vento não conseguiram voar e ficavam ali com ele. Mas as que lhe chegaram eram tão lindas, tão verdadeiras, tão “Ele”, que ela sabia no mais profundo do seu ser, que sim, ela teve um pouco dele. Sim, era Ele que chegava a ela.
Permaneceu muito tempo assim, mirando-o de olhos fechados. Poderia ficar uma vida toda.Toda uma vida.
Mas algo lhe pedia para abrir os olhos, não entendia bem o que era, mas sentia. Sentia um desejo enorme de simplesmente abrir seus olhos. Ao abri-los, qual foi sua surpresa, ao ver, Ele, o homem,  a sua frente de olhos fechados mirando-a.

domingo, 30 de octubre de 2011

Distâncias

Diante do papel, pensava em tudo o que tinha para lhe dizer. Por onde começar, não sabia. Como dizer o indizível? O sentir era tanto que não cabia em palavras. Mas, eram as palavras que os ligavam, elas eram o único contato que tinham, sem elas, eles não existiam. E ela sabia no mais profundo de sua alma, que ali residia o abismo, a distância entre eles. Para Ser com o outro é preciso olhares, é preciso toques, é preciso abraços, é preciso encontros... E exatamente por saber, que as palavras silenciaram nela, sua alma não podia mais se dizer somente em palavras, precisava do olhar do outro sobre si, precisava sentir através desse olhar, que ela lhe tocara a alma. Não podia mais, o que antes lhe era leve, agora pesava em sua alma. Levantou-se então, deixando o papel em branco, sabendo em seu coração que estava se despedindo.

viernes, 21 de octubre de 2011

Delírios

Sim, estás aqui. Fecho os olhos e te vejo. Te sinto. Te pressinto. Tuas mãos,  deslizando sobre a minha pele, percorrendo os meus caminhos teus caminhos. Tua língua a sentir-me o gosto, a percorrer meus lábios, meus seios, minhas coxas, meu sexo úmido, a sugar minhas águas, meu gozo. Teu sexo a fazer-me tua, tão somente tua, entre gemidos e delírios. Sim, estás aqui. Eu sinto..

jueves, 13 de octubre de 2011

A espera

Já o esperava a muito tempo, mas qual foi a sua emoção ao ouvir tocar a campainha. Era Ele. Sim, Ele chegara. Sabia que ao abrir a porta, estaria abrindo caminhos, sua vida não seria mais a mesma.  Trêmula, dirigiu-se a porta, dirigiu-se a Ele. O abraçou por um longo tempo e sem dizer uma só palavra o levou até seu quarto, deitou-o em sua cama e o tocou quase com medo... Medo desse contato, medo do que  poderia ser da sua vida depois de Tê-lo. Com as mãos ainda trêmulas o acariciou ternamente, o fitou eternamente e sem mais conter-se, abriu a primeira página e o devorou ali, naquela mesma noite...

domingo, 9 de octubre de 2011

Sonhos




Quando crianças gostavam de brincar de bolinhas de sabão. Ela adorava inventar nomes para cada bolinha antes de soprá-la e vê-la voando pelo céu. Ele gostava mesmo era de correr atrás das bolinhas, acreditava que poderia segurá-las nas mãos em concha e levá-las de volta. Desde cedo, ele, sonhava em capturar o impossível.
Sonhava ela, que cada bolinha que voava pelo céu ia ao encontro de outra criança que em algum lugar estaria a esperar por ela para brincar. Imaginava um menino correndo atrás das bolinhas tentando pegá-las. Assim, sempre que soprava uma bolinha, fechava seus olhos e a inundava com o seu mais sincero amor.
Sonhava ele, que um dia ainda iria encontrar a criança dona das bolinhas e devolvê-las todas. Sempre que pegava uma bolinha imaginava que quem a tinha soltado era uma menina, que com os olhos fechados soprava e as deixava ir. Sem a conhecer e sem sabê-la a amava em cada uma das bolinhas que segurava.
O tempo passou, eles cresceram, outros sonhos foram sonhados, mas os sonhos de criança que de alguma maneira os uniam, não fôra esquecido. Sempre que podiam iam ao parque da cidade brincar de bolinhas de sabão.
Um dia, estava ele, tentando como sempre segurar o impossível, quando sem nenhuma explicação, conseguiu segurar em suas mãos uma bolinha, buscou com o olhar quem as estava soltando e de longe avistou uma moça com os olhos fechados, exatamente igual a menina que sonhara toda uma vida, numa imensa alegria correu até ela e muito suavemente colocou a bolinha em sua mão. Ela, surpresa, abriu os olhos e deixou cair uma lágrima de felicidade.


PS: Esse texto foi escrito a partir da poesia "No tempo da delicadeza" do escritor Carlos Eduardo Leal, segue o link de seu blog para quem quiser conferir http://veredaspulsionais.blogspot.com/

miércoles, 28 de septiembre de 2011

Vazio

De repente, o corte
o medo, o silêncio.
O Céu ficou totalmente fechado, 
mas não choveu, nenhuma gota caiu, nada.
Apenas a escuridão, uma profunda escuridão,
pairando sobre a Terra, deixando-a num imenso vazio.
Num vazio imenso.

martes, 20 de septiembre de 2011

Nua

Estava ela desapercebida, juntando os pedaços que sobrara de sua vida, tentando inutilmente reconstruir uma roupa que pudesse cobri-la, protegê-la deste estado de nudez em que se encontrava. Não percebeu quando ele chegou, não ouviu seus passos, ele chegou silenciosamente. Assustada, tentou em vão cobrir-se, mas ele se adiantou a ela, tomou-lhe das mãos a possibilidade de esconder-se e a olhou, simplesmente olhou. Agora nua, completamente nua, ela caminha pela vida.

lunes, 19 de septiembre de 2011

Caminhos




Em meio a tantas pessoas, eles se viram. Que linda que ela estava, como o emocionava vê-la dirigir-se a ele. Ela, apenas o via e ia ao seu encontro.

Não se disseram nada, apenas caminharam juntos por um bom tempo, um do lado do outro, imersos em seus pensamentos, sentindo somente a certeza do outro ao seu lado.

Ela, imaginava tudo o que poderia viver com ele: o passeio de mãos dadas, o sorriso compartilhado, a primeira briga, o pedido de desculpas, o abraço, o beijo nos olhos, o carinho, suas histórias, seus sonhos, seus medos, seus silêncios. E, quando o tempo passasse, se emocionaria por sabê-lo tanto, por já reconhecer cada gesto seu, cada história contada e recontada sempre de uma maneira diferente, por saber como ele afagaria seu cabelo e mesmo que ele não afagasse, ela já o sentiria. Estremeceria sempre cada vez que ele lhe olhasse com a mesma ternura do primeiro dia.

Ele, imaginava que lindo seria compartilhar a vida com ela, que tão terno seria poder deitar a cabeça em seu colo e entregar-se sem reservas a este imenso amor. Não saber-se mais sem ela. Não saber-se mais sem o seu sorriso, sem o seu olhar, sem o seu amor. Assim, totalmente imersos em seus sonhos, seguiram caminhando. Pareciam felizes. A vida lhes parecia suave.

Chegando na esquina, voltaram de seus sonhos. Se olharam, Sorriram. E, por não acreditarem no único que era real, seguiram  sós, cada um com seu medo. Ela, desceu as escadas do metrô e ele, atravessou a rua sem olhar para trás. Deixando assim, para outros, talvez mais corajosos, a possibilidade de um grande amor.

https://youtu.be/WCnArLi3uCk


domingo, 11 de septiembre de 2011

Ritos de vida


Com a firmeza da alma dos que sabem que a mudança é inevitável, procurava ela, em suas gavetas, a história que um dia construíra para viver. Seu roteiro. Sabia que ele estava por ali, em alguma daquelas gavetas, mas qual? Vasculhava uma por uma, cuidadosamente, sem nenhuma pressa, tinha a certeza que iria encontrá-lo. Foi uma procura profunda, demorou dias, semanas, meses, anos... E lá no fundo, no mais fundo de suas gavetas, estava ele, coberto por um tecido fino transparente, como estivesse esperando há tempos esse momento. Com as mãos trêmulas, retirou-o do fundo da gaveta. Tinha uma capa grossa, escrita com letras grandes e negras... Que pesado que ele era... Encostou-o em seu peito e com muita coragem levou-o para sua cama, deitou com ele. Com lágrimas nos olhos conseguiu abrir a primeira página e leu. Leu devorando cada palavra, como os amantes urgentes se devoram. Ao terminar, enxugou as lágrimas, olhou-se no espelho e olhando profundamente em seus olhos, gritou: Não!

Saiu de seu quarto, sua casa. Correu pela praia... Era noite, noite de lua, de fêmea, de ventre, de vida... E com a vida pulsando em sua alma, fez uma fogueira imensa, arrancou a roupa de seu corpo e jogou-a na fogueira. Começou a dançar, a cantar, a invocar suas irmãs mulheres que um dia estiveram por aqui e que ainda vão estar. Circulava em volta da fogueira e, a cada volta rasgava uma página de seu roteiro e jogava no fogo. Cada volta uma página, até não restar mais nada dessa história. Por último jogou a pesada capa e ficou parada, olhando o fogo consumir aquelas letras grandes e negras.

Na mais imensa paz, caminhou para o mar, deixou-se mergulhar profundamente por suas águas... Agora limpa, vívida e inteira recitava para o Universo, as primeiras palavras de sua nova história: Era uma vez uma mulher feliz, que não temia mais amar e...

jueves, 8 de septiembre de 2011

O Amor

De noite, grávida
Pulsa, ele, em meu ventre
Danço nua sua presença
De dia, sangro
Expulsa, ele, o meu ventre
Visto imóvel a sua ausência
Teima, ele, se fazer vida em minha vida.

Desejo

Claro que desejo o teu desejo!

Que desejo o teu olhar no meu...

Que desejo sentir o cheiro da tua pele...

Que desejo sentir o gosto de teus beijos...

Que desejo sentir a suavidade do teu abraço...

Que desejo. Desejo. Desejo. Desejo...

Mas, agora, bastaria que tua mão tocasse a minha.

miércoles, 7 de septiembre de 2011

Toques d'alma




As mãos... Como, para ela, carregam os traços de um homem. Aprendera, desde muito cedo, a conhecer um homem pela suas mãos, pela sensação que provocava em sua alma, o toque dessas mãos.

De menina, quase nunca tocou as mãos de seu pai, mas lembra que elas eram ásperas, pesadas, grandes, firmes. Passou muito tempo acreditando que todos os homens deveriam ter mãos assim. Numa espécie de obsessão, passou a buscar as mãos de seu pai nos homens que ia conhecendo pela vida. Nesse conhecer, foi desconhecendo as mãos que tão pouco lhe tocou, tão pouco lhe afagou. E talvez por negação, começou a preferir os homens de mãos suaves, mãos ternas. Apesar de não dispensar a firmeza. O homem precisa ter mãos firmes para amparar sua mulher e impedir que ela caia nos abismos de sua própria alma.

Pensava sempre que sensuais podem ser as mãos de um homem... Quantas possibilidades carregam... Que marcante é o movimento que elas fazem no ar quando eles falam... Como dizem deles...

Das mãos que conhecera, as que mais lhe marcaram a alma, foram as de seu professor de piano. Em seu primeiro dia de aula, ficou fascinada com a leveza as quais elas se deslizavam pelo piano. Que ágeis que eram ao tocar cada tecla, como conheciam e eram íntimas de cada uma. Uma intimidade quase sexual. Experimentava sensações, sentires indizíveis ao vê-las tocar. Seu professor, o dono das mãos, tinha um ritual que sempre seguia. Ele chegava diante do piano, sentava-se. Tocava com muita delicadeza a tampa do teclado, levantava-a, retirava o pano que cobria as teclas, deslizava suavemente suas mãos sobre elas e começava a explorá-las, a tocá-las uma por uma... Aos poucos uma música ia tomando o ambiente, enchendo de sons sua alma. Esse ritual, entre as mãos e as teclas, povoou suas noites durante muito tempo. Tinha febres, delírios. Imaginava-se o piano.

Um dia, como num sonho, em uma dessas aulas, as mãos dele tocaram as suas. Precisava, ele, ensinar-lhe sobre intensidade. Ela não podia crer que aquelas mãos, agora tocavam as suas, deslizavam sobre os seus dedos e, ternamente, ensinavam-lhe a sentir a música. Que intensos eram os toques de suas mãos. Quantos sentires lhe provocava... Quantos. Eram toques d’alma... Como aprendeu, ela, de intensidade...

Foram muitas, depois desse dia, às noites intensas, onde se (com)fundiam seu corpo com as teclas, as teclas com seu corpo... Não se sabia mais onde começava um e terminava o outro. A música que compunham era puro silêncio.

Mas a vida tem acordes dissonantes, faz parte da harmonia. E eles, apesar de músicos, não se deram conta. Não compreenderam. Não estavam preparados para esses sons tão fortes. Partiram. Nenhum som mais restou. Ela, desde esse dia, nunca mais tocou, era sua maneira de guardar luto. O tempo passou... Passou levando todas as lembranças. O único que não levou foi a certeza que reconheceria, assim como uma cega, o toque destas mãos, no decorrer do tempo.

domingo, 4 de septiembre de 2011

Sobre o sonhar


Quero tocar o Céu e por Ele ser tocada, envolvida. Senti-Lo passar sobre mim como uma carícia. Eu que sou Terra Árida, necessito que Ele me inunde com suas águas. Me fecunde. E que em mim, a vida brote. E quando a noite chegue, que Ele me anoiteça, para que tranquila eu possa me perder na imensidão de Ser.

viernes, 2 de septiembre de 2011

Desejos








  • Percebia por sua respiração o quanto estava nervosa, ela mesma não entendia o que estava acontecendo, como chegara  a casa de um estranho por um simples anúncio e como agora desejava ardentemente o homem a sua frente.

    Na verdade, foram vários os motivos que a levaram ali, mas o principal era o medo de saber-se esquecida. Desde que veio morar em outro país sofria da angústia de não reconhecer-se mais e, a falta de reconhecimento que sentia nas pessoas a sua volta, reforçava a sua angústia. Quando menina sempre passou desapercebida, mas agora a sensação que tinha era que realmente não existia. Seu próprio esposo não a enxergava mais, a tratava como se fosse uma estranha, mas era pior do que fôra uma estranha, pois quando algo nos parece estranho temos a curiosidade de saber, seu esposo não queria saber, essa era a verdade, a impressionava o quanto ele não sabia mais dela, o quanto os seus sentimentos, seus sonhos, sua vida já não era mais nada para ele.
    Assim que, tinha uma necessidade quase vital de ser vista, ser notada, ser percebida por alguém e foi esta necessidade que a levou a casa desse estranho.
    No caminho, ia imaginando o que poderia acontecer, como um homem pôde colocar um anúncio que necessita a ajuda de uma mulher para voltar a sentir desejos, que homem tão estranho era esse? E o que lhe aconteceu para pedir ajuda dessa maneira? Seria uma brincadeira de mau gosto, ou seria verdade? E por que ela sentia-se tão atraída de conhecer esse homem, de saber de sua vida, de simplesmente vê-lo?
    Em volta em seus pensamentos não percebeu que o coletivo já chegava perto, de um susto voltou à realidade, seu coração estava em sobressaltos, pois chegara a seu destino. Era uma casa típica de classe média portenha, de dois andares, portões de ferro, uma escada na entrada. Parou diante do portão e viu que estava aberto, entrou, subiu a escada e parou diante da porta. Seu primeiro ímpeto foi voltar, esquecer tudo e seguir sua vida, mas agora já não podia, pois o que poderia acontecer ao passar aquela porta, também já era sua vida. Não conseguindo mais controlar sua emoção, tocou a campainha. Uma senhora atendeu, ela tentou explicar da melhor maneira o que veio fazer, tentando falar o melhor possível, para que a senhora não percebesse que ela era uma estrangeira, mas apesar de seu nervosismo, a senhora parecia estar acostumada a esse tipo de visitas, assim que a levou a biblioteca da casa e pediu que esperasse um momento que seu patrão já iria  recebê-la.
    Foram os cinco minutos mais longos de sua vida, imaginou como seria esse homem, que defeitos teria. Seria gordo? Magro? Calvo? Teria cabelos longos? Usaria óculos? Seria baixo, ou alto? Como seria esse homem? E o que ela diria a ele? - bom, desculpe-me, vim por seu anúncio- sorriria para ele? Demonstraria o quanto estava nervosa? Realmente não sabia o que fazer, queria ardentemente que ele chegasse e terminasse logo com essa angústia do não saber... Então, resolveu acalmar-se olhando os livros que tinha na biblioteca. Pelos livros via-se que  tratava de alguém que gostava de arte e de literatura. Bom, menos mal, seria um artista… envolta em seus pensamentos não se deu conta que alguém entrara na biblioteca, só percebeu quando escutou uma voz grave, firme e ao mesmo tempo terna cumprimentando-a:
    ·     Hola, sois Elena, no?
    ·   Sim sou – respondeu contendo o máximo possível sua emoção, pois o homem que via, não parecia nada ao que imaginava. Estava diante de um homem de uma beleza extraordinária.  De uma verdade no olhar na qual nunca tinha visto. Um olhar que pedia somente outro olhar.
    Ficaram-se olhando por um tempo, sem dizerem uma só palavra, tão presentes neste olhar que não conseguiam formular nenhum pensamento acerca do outro, apenas se olhavam.
    O olhar dessa mulher dizia tanto, tanto de si, que para ele não necessitava  nenhuma palavra para que compreendesse o porquê dela estar ali a sua frente, era diferente de todas as que já tinham tentado lhe ajudar, a verdade no seu olhar, a ânsia, quase um pedido, de ser desejada o levou a sentir emoções que acreditava esquecidas, descobriu que sentia uma necessidade urgente de possuí-la, mas desejava muito mais que seu corpo, queria tê-la por inteiro, sabia, que por um breve instante poderia quase  tocar sua alma.
    Era-lhe incompreensível como o homem a sua frente, com apenas um olhar pudera decifrar todos os seus sentimentos, sentia-se completamente desnuda, mas não conseguia em nenhum momento desviar o olhar, pois desviá-lo seria como deixar de existir, pois nestes três anos nunca ninguém a  olhou como ele a olhava agora.
    E foi assim, sem dizer uma só palavra que os dois viveram um dos momentos mais intensos de suas vidas, momento este, que seria lembrado por toda uma existência.
    Não tinham a urgência dos amantes que mal se conhecem, ao contrário, pareciam conhecer-se de toda uma vida... Ele a levou pela mão até seu quarto. A convidou para entrar. Fechou a porta. A abraçou e com muita ternura beijou seus lábios, deslizou suavemente suas mãos por suas costas e com a intimidade de quem conhece, começou a tirar-lhe a roupa, a tocar-lhe o corpo, a sentir seu cheiro e em um breve instante, que a ela pareceu uma eternidade, a levou-a a sua cama, a deitou e a mirou, mirou com um desejo nunca antes sentido, queria gravar para sempre em sua memória cada parte do corpo daquela mulher, que linda estava nua em sua cama, como a desejava... Sentia por sua respiração o quanto ela também ansiava por esse momento, tinha uma mistura de desejo e medo em seu olhar que era alucinante, necessitava urgentemente tocá-la, sentir seu corpo estremecer com suas carícias, e assim o fez, tocou-lhe o corpo querendo reter para si sua forma, sua delicadeza e quase como um delírio experimentou o prazer com todos  os sentidos possíveis a um homem, não conseguia mais distinguir o que era a realidade. Mergulhou profundamente num mundo de toques, sabores, cheiros... Experimentava um prazer jamais sentido ao dar prazer àquela mulher, era alucinante sentir seu corpo estremecer a cada carícia sua e mais alucinante ainda foi fazê-la, vê-la, senti-la chegar ao cume de seu prazer, sentir que seu corpo pedia desesperadamente o seu e senti-la experimentar o mais íntimo de sua essência de mulher ao fundir-se a ela, numa entrega  inexplicável, indizível, que só quem a viveu a consegue compreender.
    Sentir-se nos braços daquele homem era algo irreal, seu cheiro, sua presença, seu toque,  não lhe deixava outra opção, a não ser, ser mulher. A suavidade e a ternura de seu beijo a transportou a um mundo de sonhos, de prazeres que imaginava nunca mais poder vivê-los. Sentiu como que estivesse caindo em um abismo,  ao perceber que ele a desnudava, suas mãos deslizando sobre o seu corpo provocou nela um prazer que era quase uma dor, o toque de suas mãos ia além da sensualidade, era como se ele tivesse o poder de devolver a vida  cada parte do seu corpo, antes esquecida, com um simples toque. E num instante, que para ela foi a eternidade, sentiu-se mirada, como jamais algum homem ousou mirá-la, o olhar desse homem era mais que um olhar de desejo, era como se ele  tocasse sua alma. Nesse momento, em sua vida, nada mais lhe importava, a não ser, ser desse homem, dar-se a ele e a esse momento com toda a  entrega que só as mulheres conseguem.
    E em meio a um delírio, eles passaram toda uma tarde de profunda entrega. Entrega de corpos, de sonhos, de desejos, de almas... Até chegarem à exaustão de tanto amar...  entregando-se juntos a paz, a paz depois do amor, a plenitude que nos dar depois de saber-se um do outro. Assim, adormeceram, abraçados, na mais profunda entrega...
    Acordou,  como quem sai de um sonho real, olhou o homem dormido ao seu lado, acariciou-lhe os cabelos,  sabia que agora era hora de partir. Levantou-se sem fazer barulho, vestiu-se, deixou escrito para ele  fragmentos de uma poesia, que para ela, era o que de mais lindo e sincero que alguém podia escrever e que um dia na vida seu amigo poeta escrevera, e partiu.
    Um ano se passou e agora estava ela olhando pela janela do avião, com suas filhas ao lado, sentia uma imensa alegria de vida, pois sabia que ia de regresso a sua casa, a sua história, tinha muitas lembranças fortes desta cidade que deixava, mas a que mais gostava de lembrar era o seu encontro com aquele homem que nem sabia o nome,  a lembrança era tão nítida, como se tivesse acontecido ontem.
    Imersa nos seus pensamentos, voltou à realidade, quando sentiu que alguém a olhava, e este olhar o reconheceria sempre, pois foi ele quem a trouxe de volta a vida. Por alguns segundos, sentiu a mesma sensação de um ano atrás, de ser reconhecida no mais íntimo do seu ser. Era ele, sim, o homem na qual esteve, estava mais lindo, seus olhares durante segundos não conseguiram se desviar, segundos que pareceram a eternidade. Mas a realidade os trouxe de volta dos sonhos, suas filhas lhe perguntavam sobre a viagem e a mulher que estava com ele o levou pela mão ao seu assento. Experimentou novamente a angústia do não reconhecimento, queria chegar logo ao seu destino, encontrar as pessoas, abracá-las, sentir-se reconhecida.
    Ao chegar ao aeroporto de sua cidade, foi recebida exatamente como imaginava, estavam todos lá. Sua família, seus amigos, todos que um dia na sua vida fizeram parte de sua história, que a olhavam com olhos de quem conhece. E no meio do choro, da alegria, da imensidão da felicidade do encontro, sua filha maior, lhe entrega um papel, dizendo que foi um homem que estava no avião que pediu que a entregasse. No meio das lágrimas, leu algo que lhe inundou o coração de uma imensa felicidade existencial, pois dizia:
    ‘ ...Mi mirada vio la tuya, yo te vi, tu me viste, tu me haces ver, tu eres el amor... em mi corazón tu existencia me hace feliz, incluso sin que me hables y sin que sepas mi nombre voy a seguir viendote...’ *
    Reconheceu os fragmentos da poesia que um dia escrevera como despedida de um encontro casual.



    * fragmentos da poesia “Tato Amarelo” de Ítalo Rovere